domingo, 20 de fevereiro de 2011

Diocese de Angra insustentável?


        Ontem, no jornal “A União”, dei, de chofre, com este título: “Com o modelo actual Diocese de Angra “não é sustentável”.
        Depois de ler o texto, ficámos algo perplexos. E ficámos perplexos, porque, de imediato, nos vieram à mente lembranças de tempos não muito recuados, e os possíveis desenvolvimentos que entretanto se deram ou se geraram.
        Há 50 anos havia, no geral, um pároco para cada paróquia. Quase todos viviam pobremente, ainda sem automóvel, deslocando-se na camioneta da carreira ou de bicicleta e a pé – quantas vezes vimos o P. José Ávila na estrada do Mistério, ora num sentido, ora no outro – e sempre encontravam umas migalhas para o café da manhã, e umas sopas de couves solteiras, ao meio dia ou à noite, cozinhadas por algum familiar disponível.
        Já nesses tempos recuados, os tais 10% eram obrigatórios para a Diocese. E o Cónego Gil Mendonça, o ecónomo diocesano de então, não perdoava nada. Eram obrigações sacras, de coisas sacras, sacrilégios para os incumpridores.
        Hoje, os tempos são outros. Decorreram muitas transformações na sociedade civil e laica. Que entrou por toda a parte. Na sociedade religiosa – por razões claras e evidentes, com raízes profundas nas suas estruturas – os servidores mais próximos foram-se afastando e a renovação interna foi sendo diminuta.
Seria lógico, pois, que os pouco tostões de antigamente dessem para os tempos de hoje, já que a população açoriana se manteve mais ou menos estável. Naturalmente, que as receitas deveriam ser as mesmas ou semelhantes. Mas o certo, pelo que se diz, é que diminuíram os funcionários e diminuíram as receitas. E aqui começa com o nosso comentário.
E as perguntas logo nos acodem, de rompante, à mente: quais as razões de tão diminutas receitas que levam os responsáveis a dizer que a Diocese de Angra é insustentável? O que se terá passado? Como se explica tudo isso?
A vida paroquial de antigamente era uma vida de isolamento, de atenção a tudo o que poderia ajudar a sustentabilidade de todo o conjunto paroquial – conservação do património, sustentabilidade das actividades e da vida humana directamente responsável.
Além disso, era uma vida de eremita – alguns cultivavam as suas pequenas hortas – sem qualquer ajuda do principal responsável, que funcionava mais com a ameaça da espada, do que com o afecto e a compreensão paternal. O aviso da “obediência cega” pairava no ar sempre ameaçador. Uma Igreja mais madrasta do que mãe. E também, como hoje, eivada de compadrios, afeições e aparências.
Apesar de tudo havia sempre alguma migalha para matar a fome, e a Diocese nunca gritou nem alertou para a sua falência. E nunca um Bispo mandou fazer peditórios para saldar dívidas.
No texto que provoca este apontamento insinua-se um Vigário Geral para São Miguel, uma espécie de segunda Diocese. Diz-se que a Ilha de São Miguel está mais bem preparada religiosamente.
Talvez se queira dizer que São Miguel vai fazer as suas economias à parte, e as outras que se governem como poderem. Uma excelente solução! Um primeiro passo para uma divisão que não se deseja, e que nunca se desejou.
O que mais nos espanta é que nada se diga da gestão de quantos, espalhados pela Diocese, asseguram a sua sustentabilidade. É o “religiosamente correcto” que o impede? É bom recordar que já não funciona como muitos desejariam. E seria óptimo começar primeiro por aí.
Na verdade, estamos perante problemas próprios das sociedades fechadas, das sociedades secretas. Por dentro tudo é controlado, abafado, encoberto. Veja-se o caso dos abusos sexuais no que deram. É a prova do que afirmo. Ninguém controla ninguém e todos se controlam uns aos outros. São os compadrios e as afeições a comandar a barca. Ninguém fiscaliza. O pior é quando algo transparece. É uma desgraça!
Fico, por isso, espantado quando um funcionário vem para o público dizer que a Diocese é insustentável. Que credibilidade traz consigo? Só vem aumentar a suspeição, e nada mais.
Alguma vez se viu uma contabilidade eclesiástica auditada por uma pessoa independente e laica? É a questão que deixo em aberto.
Finalmente, quando se entra numa igreja e se ouvem palavras condenatórias contra pessoas presentes ou ausentes, logo poderão aparecer as reacções. Que, no geral, são silenciosas. Cada um dirá. As pessoas faltam. E se faltam também não trazem a sua dádiva. “Hei-de dar a quem o merecer”. (altodoscedros.blogspot.com)